Há uma sensação que me foi ficando perante a dinâmica e a comunidade do hobby, mas sobre a qual só agora me pareceu apropriado escrever algo. Parece-me que existem duas gerações de jogadores de hobby em Portugal. Podem existir mais, mas estas duas saltam-me à vista. Tenho a sensação de que existem os gamers que surgiram antes da proliferação das redes sociais e os gamers depois da proliferação destas. Os gamers que usavam o “Abre o Jogo” (AoJ) como principal veículo de comunicação e os que agora usam principalmente as redes sociais, especialmente Facebook. Se o AoJ já não é o que era, como referência, porque o modo de usar a internet mudou, provavelmente os gamers também estão a mudar porque são de outra geração.
Tentando identificar uma data para conseguir separar isto, talvez o ano de 2010 seja uma referência a ter em conta, embora o ano de 2015 também tenha tido alguma importância, pois foi aquela data em que a Leiriacon cresceu e começou a ganhar uma escala maior e a receber mais público que a ela se deslocava por mera curiosidade, para além do ditos gamers mais experientes que continuam a ser os participantes maioritários. Em alguma bibliografia, tal como o livro “It´s all a game: from monopoly to settlers of Catan”, de Tristan Donovan, publicado em 2017, somos levados a concluir que o final da primeira década do século XXI marcou o início de uma era em que os jogos de tabuleiro de hobby ganharam novos públicos, mais abrangentes, disseminados para uma comunidade maior a partir dos polos académicos e tecnológicos. Conhecem-se casos de “Settlers of Catan” ser uma “trend”, uma tendência, em Silicon Valley bastante bem conhecido nesse período de 2009/2010.
Existem em Portugal gamers com um conhecimento enorme sobre jogos de hobby, de todos os géneros. No entanto, estes gamers, tendencialmente do primeiro período, tendem a interagir pouco nas redes sociais, e assim com os novos gamers. Será que isto é verdade ou é apenas uma perceção pessoal? Partilham desta opinião? Já sentiram isto em algum momento? Eu tenho sentido isso, especialmente como criador de conteúdos. Por vezes fica-me a sensação que sei muito pouco perante outros jogadores de hobby mais antigos.
Tenho sentido também uma busca crescente por conhecimento por parte dos novos gamers, que me parecem ser mais abertos a interações que os gamers mais antigos, muito embrenhados nas relações pessoais que têm cultivado ao longo dos anos com a comunidade de jogos. Do que tenho percecionado estes gamers mais experientes também são os que vão menos a encontros públicos e mais ficam por casa com os seus encontros privados com outros gamers do seu grupo de jogos. Isto pode ser uma perceção completamente enviesada pela minha experiência pessoal, pois não tenho dados quantitativos para suportar isto, no entanto é algo que deixo para discussão. No entanto, também se vendem muitos jogos para uso de quem não se assume este hobby como uma cultura e elementos de pertença a uma comunidade. Isto aconteceu comigo, quando entre 2002 e 2009/2010 apenas jogava “Settlers of Catan” com amigos, aqueles com quem depois fundamos os Boardgamers de Leiria e faço os vídeos no canal de youtube.
Será então que existem mesmo duas gerações de gamers? Se existem como interagem, se é que interagem de todo? Outra coisa que me intriga é que houve alguns projetos de gamers mais antigos de produção de conteúdos que depois pararam de produzir, parecendo não ter acompanhado o crescimento notório do hobby. Com isso esse espaço vazio passou a ser ocupado cada vez mais por gamers da segunda fase. Como são estes novos gamers que comunicam mais com a comunidade de hobby online? Será estamos apenas a passar mensagens de quem está no hobby há pouco tempo? Pode isso ter um efeito na cultura da comunidade, de como ela se vê e identifica? Será que temos duas comunidades e não apenas uma? Haverá tipos de jogos que são mais jogados por uma geração do que por outra? Podem os gamers mais experientes ajudar os novos gamers e novos criadores de conteúdos.
Pessoalmente entrei no hobby um pouco entre estas duas gerações, sendo que já jogava jogos de cartas colecionáveis em meados dos anos 90, e depois fui conhecendo outros pontualmente, mas sem grande abrangência ou profundidade. Por me ter escapado um período temporal grande do hobby também fico com receio de estar a dizer algum tipo de alarvidade quando produzo algum tipo de conteúdo, mas encaro isso como um risco necessário e inevitável do processo de aprendizagem.
Chegando ao fim deste texto, concluso que acabei por deixar muito mais perguntas que respostas. Pode ser que me ajudem a chegar a conclusões, apesar de eu não apreciar muito jogos colaborativos
Autor: Micael Sousa