quarta-feira, 23 de maio de 2018

Caixas enormes e inserts inúteis - opinião por Micael Sousa

Uma daquelas coisas que me irrita são as caixas excessivamente grande de determinados jogos. Quer dizer, também me irritam as pequenas e especialmente os chamados “inserts”. Então vamos por partes, por componentes como nos jogos.

Fonte da imagem: https://www.wsj.com/articles/SB10001424127887324188604578541843266186054

Há jogos cuja caixa é enorme e lá dentro encontramos meia dúzia de coisas. Aquele trambolho vai ocupar muito mais espaço do que seria necessário. Isto a mim irrita-me bastante, pois ando sempre a dizer que os jogos de tabuleiro são produtos sustentáveis. Caras editoras. Ocupar espaço a mais destrói esse potencial, que não é de minimizar. Peguem nisso, desse fator diferenciador para promover os jogos. Os jogos podem ser realmente sustentáveis, a múltiplos níveis, mas ocupar espaço vazio sentido é problemático e insustentável, pois obriga a que tenhamos de ter mais espaço de arrumação, com áreas maiores nos nossos lares, que implicam casas maiores. Com essa necessidade ocupamos mais solo, o que nos força a viver cada vez mais na periferia e com isso a gerar mais viagens para a vida do dia-a-dia. Isto é um verdadeiro problema. Minhas editoras lindas, pensem nisso.

Por outro lado, não se metam a reduzir as caixas ao ponto de não caber nada lá dentro, especialmente quando têm já expansões na manga que não adicionaram ao jogo para nos cobrar mais uns euros mais tarde.

Já os “inserts”, aquelas coisas de plástico moldado que alguns jogos trazem no interior, produzindo divisórias que servem para “organizarmos” os componentes, são quase sempre terríveis. Escrevi “organizar” entre aspas porque o que os inserts mais fazem é: desorganizar os componentes. Quase todos os inserts são concebidos para utilização na horizontal. Mas nós guardamos e transportamos os jogos na vertical. Os jogos que guardo empilhados na horizontal esmagam-se com o peso. E como as caixas são volumosas, quase sempre para nada, nem sequer têm sustentação para serem empilhados de forma resistente uns sobre os outros. Já não consigo contabilizar quantos inserts mandei para o lixo ou quantos tenho de manter para dar estrutura e solidez à caixa tendo de recorrer na mesma a sacos. Depois quanto penso que aquilo eventualmente contribuiu para o jogo ser mais caro ainda fico mais irritado. Metam pelo menos uma tampa nos inserts, como acontece no Feast for Ódin ou no Francis Drake.

Bem. Em resumo parece que há aqui muito para fazer na indústria no que toca à otimização das caixas dos jogos. Só para não dizerem que só digo mal há um jogo que queria destacar pela positiva. Clans of Caledonia tem imensas peças, não tem “inserts” e os sacos servem perfeitamente. Tem uma caixa pequena/média cabendo lá tudo, sendo um eurogame de dimensão considerável. Sigam este exemplo. Vamos lá pensar “dentro da caixa”. Os clientes agradecem.

segunda-feira, 7 de maio de 2018

A importância dos perfis individuais dos jogadores na escolha dos jogos - opinião por Micael Sousa

Estive no "4.º encontro sobre jogos e mobile learning", organizado pela Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra. Fui lá na espetativa de tentar perceber o que se andava a investigar e trabalhar na academia sobre os jogos, especialmente nesta área da educação, com a qual não tenho muita proximidade teórica.

autor: Micael Sousa

No encontro, a esmagadora maioria dos casos referiam-se aos jogos digitais, o que já seria de esperar tendo em conta a dominância tecnológica. No meu caso participei como relator da experiência dos Boardgamers de Leiria, na utilização de jogos de tabuleiro modernos em vários contextos de inovação por este grupo de entusiastas. Pelo que percebi, enquanto fazia a minha intervenção e aquando das respostas a questões, notei uma curiosidade geral sobre isto dos jogos de tabuleiro modernos. Apesar de um certo desconhecimento generalizado, em conversa com alguns investigadores que se se dedicava mais à conceptualização, encontrei quem conhecesse estes jogos e as atividades dos Boardgamers de Leiria. Fiquei surpreendido especialmente pela parte dos Boardgamers de Leiria, porque estamos em Leiria, afastados das universidades que se dedicam a estes assuntos e das grandes metrópoles onde é mais fácil juntar mais interessados em temas de franja e subculturas como esta dos jogos de tabuleiro.

De todas as comunicações impressionou-me a de Nelson Zagalo, professor na Universidade de Aveiro. Abordou a influência dos perfis dos jogadores, no modo como se experimentam os próprios jogos, e de como se formavam dois grandes grupos de jogadores: os sistematizadores e os empatizadores. Segundo Zagalo os sistematizadores focam-se em explorar os sistemas lógicos dos jogos, compreender os padrões e melhorar competências na execução das tarefas no jogo. Já os empatizadores adoram conhecer e aprofundar as relações humanas, as histórias e as emoções geradas ou inerentes ao jogo, envolvem-se nos dramas e contextos sociais dos jogos.  O investigador referiu que estes serão os casos exemplificativos tipificados, que será muito provável que um jogador padrão apresente caraterísticas de ambos os grupos, podendo apresentar tendências para um determinado perfil sem com isso deixar de poder exibir portamento associados a traços do outro tipo.  Com isto para advertir para os casos em que se usam jogos para determinados fins, em que não se atendem aos perfis, o ato de “mascarar” um jogo não garante sucesso só porque é feito de forma alternativa. A essência da experiência de jogo terá sempre influência e, mais tarde ou mais cedo, as pessoas vão perceber que os jogos é que as estão a jogar e não o contrário.

A minha prática pessoal de vários anos a lidar com muitos jogos de tabuleiro e ainda mais reações diferentes aos vários jogos, em eventos públicos, familiares e entre amigos e conhecidos, leva-me a fazer paralelismos com as constatações de Zagalo. Diria que encaixam na perfeição. Quem tem por hábito apresentar jogos e colocar novos públicos a jogar apercebe-se que uma escolha de um jogo desadequado pode ser suficiente para que a pessoa que o experimenta nunca mais queira jogar qualquer outro jogo. Partindo da definição de perfis de Zagalo, se propuser um party ou role play game a um jogador sistematizador dificilmente ele quererá jogar ouro jogo de tabuleiro modernos, ficando toda a experiência com jogos condicionada. O mesmo se verifica inversamente para os empatizadores, para aqueles que um eurogame, de estratégia, gestão e otimização, poderá ser um verdadeiro frete. No caso dos jogos de tabuleiro, por serem atividades profundamente sociais, o grupo com quem se experimenta determinado jogo, mesmo que seja um jogo de sistematização de processos de eficiência (como os eurogames), tem um impacto muito grande. Essa influência tanto pode ser positiva como negativa, e acontece para todo o tipo de jogos. A capacidade de dar profundidade e emersão no tema do jogo pode ser influenciada pelo mau ou bom ambiente do grupo e do contexto. Um ambiente divertido e empático, que se pode gerar mesmo nos jogos mais abstratos e mecânicos, pode garantir essa capacidade de integrar as pessoas nos jogos. Isto é possível e acontece em alguns jogos de tabuleiro, aqueles que estão tão bem desenhados que o melhor componente do jogo são as próprias pessoas.

Aconteceu nos encontros dos Boardgamers de Leiria situações inadequação dos jogos aos perfis. Os perfis psicológicos dos jogadores são preponderantes para acertar no jogo certo. Ao olhar para uma pessoa desconhecida é muito dificil conseguir avaliar qual o melhor jogo a experimentar numa primeira experiência. O que se costuma fazer, antes de dar inicio ao um jogo, consiste em falar um pouco com a pessoa de modo a perceber que tipo de jogos gosta de jogar, mesmo que sejam jogos de vídeo ou outras coisas. Depois é arriscar com base nessa informação, escolhendo algo simples para começar, sendo que a própria simplificada pode ser condicionante para cativar ou não. Uns gostam, outros não, uns voltam outros nem por isso. Registamos casos de quem volta muito tempo depois, experimenta outro jogo e depois confessa que afinal não apreciou a primeira experiência mais adorou a segunda. Por fim pode acontecer algo ainda mais estranho, que são as pessoas que querem ter experiências de jogo totalmente diferentes dos seus comportamentos sociais habituais. No meu caso tento implementar sempre que posso processos colaborativos nas instituições e projetos em que me envolvo, mas depois falta-me a paciência para jogar esses jogos como atividade lúdica. No caso da minha esposa, que trabalha profissionalmente e tem paixão pela análise de contextos e narrativas sociais na área da psicologia, apenas gosta de jogar os puros eurogames, profundamente mecânicos e sistemáticos, onde a dimensão interativa social e a empatia pouco relevantes são. Na minha opinião está aqui imenso assunto para ser discutido e investigado, especialmente em experiências e práticas de jogos de tabuleiro modernos. Haja oportunidade e vontade para isso.


Carvalho, A. A., Pons, J. P., Marques, C. G., Cruz, S., Moura, A., Santos, I. L., & Guimarães, D. (2018). Atas do 4º Encontro sobre Jogos e Mobile Learning. Coimbra: CEIS20.  http://hdl.handle.net/10316/48542
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